A comunista Jeannette Jara venceu o primeiro turno das eleições presidenciais do Chile neste domingo com 26,71% dos votos, seguida pelo ultradireitista José Antonio Kast com 24,12%, de acordo com dados do Serviço Eleitoral (Servel). Apesar do resultado que a coloca à frente na disputa, candidatos que se declaram como de direita somam pelo menos 50% dos votos de todo o país, deixando a candidata governista em posição desfavorável para o segundo turno marcado para 14 de dezembro.
O Paradoxo da Vitória
Jara, uma ex-ministra do Trabalho sob o governo de Gabriel Boric, prometeu contratar mais policiais, suspender o sigilo bancário para combater o crime organizado e enfrentar o custo de vida. A candidata de 51 anos faz história como a primeira comunista a chegar tão longe desde o retorno da democracia ao Chile em 1990.
Porém, o otimismo do primeiro lugar se esvai quando os números são analisados mais profundamente. O economista independente Franco Parisi surpreendeu ao terminar em terceiro com 19,42%, à frente do parlamentar ultradireitista Johannes Kaiser com 13,93% e da ex-prefeita conservadora Evelyn Matthei com 12,70%.
A Matemática Que Preocupa a Esquerda
A aritmética eleitoral mostra um cenário desafiador para Jara. Kaiser concedeu a derrota e anunciou seu apoio a Kast, enquanto Matthei rapidamente seguiu o mesmo caminho, citando a chegada de imigrantes e afirmando que o Chile precisa de uma mudança radical de direção. Parisi, por sua vez, evitou declarar apoio a qualquer candidato, dizendo que ambos precisam buscar novos eleitores “nas ruas”.
Segundo pesquisa da AtlasIntel realizada de 10 a 14 de novembro, Kast tem 10 pontos percentuais a mais que Jara na simulação de segundo turno – 49% contra 39%, evidenciando a dificuldade que a candidata de esquerda enfrentará para conquistar eleitores além de sua base.
Os Desafios de Jara
Jara nasceu em 1974 em Conchalí, em Santiago, é filha de um mecânico e uma dona de casa, e foi criada em ambiente próximo à esquerda. Durante seu tempo no governo Boric, ela viabilizou o aumento gradual do salário mínimo e a redução da jornada de trabalho de 45 para 40 horas semanais.
No entanto, a candidata enfrenta o fardo do desgaste do governo Boric, cuja aprovação beira os 30%. Apesar de ser militante originária do Partido Comunista, vários especialistas destacam sua habilidade para conseguir acordos com a oposição política e também com o mundo empresarial, embora não tenha estado isenta de críticas, sobretudo pelas definições de seu partido sobre Maduro e a Venezuela.
Falando de Santiago após a apuração, Jara agradeceu aos apoiadores e pediu aos chilenos que não deixassem que o medo do crime crescente os levasse aos braços da extrema direita no segundo turno. “Não deixem o medo endurecer seus corações”, disse a política.
Kast e a Consolidação da Direita
José Antonio Kast, de 59 anos, prometeu construir muros, cercas e trincheiras ao longo da fronteira do Chile com a Bolívia para impedir a entrada de imigrantes e requerentes de asilo de países mais pobres ao norte, como a Venezuela.
Em seu discurso aos apoiadores, Kast pediu união e prometeu “reconstruir” o Chile após quatro anos de governo de centro-esquerda, que ele chamou de “talvez o pior governo da história democrática do Chile”.
Uma Eleição Histórica e Polarizada
Esta foi a primeira eleição presidencial com voto obrigatório no Chile desde 2012. O presidente Gabriel Boric, em comunicado do palácio presidencial em Santiago, reconheceu Jara e Kast como os dois primeiros colocados que avançam para o segundo turno em 14 de dezembro, parabenizando ambos os candidatos e chamando o dia de “espetacular dia de democracia”.
O resultado reflete um Chile profundamente dividido, onde questões de segurança pública, imigração e legado do governo progressista de Boric dominam o debate político. Para Jeannette Jara, os próximos dias serão cruciais na tentativa de ampliar sua base de apoio e reverter as projeções que apontam Kast como favorito no confronto final.



