As recentes medidas cautelares impostas pelo Supremo Tribunal Federal contra o ex-presidente Jair Bolsonaro e as sanções norte-americanas contra o ministro Alexandre de Moraes marcam uma nova escalada no conflito diplomático entre Brasil e Estados Unidos. Segundo especialistas, essa sequência de eventos praticamente elimina as possibilidades de negociação entre os dois países quanto às tarifas de 50% impostas por Donald Trump aos produtos brasileiros.
O cientista político Guilherme Casarões, professor da Fundação Getulio Vargas e coordenador do Observatório da Extrema Direita, avalia que Trump esgotou rapidamente seus recursos de pressão bilateral e multilateral. Em poucos dias, o presidente norte-americano ameaçou tarifas de 10% aos países que aderissem à agenda dos Brics, anunciou as tarifas de 50% contra o Brasil com base em argumentos políticos e abriu ampla investigação contra o país por supostas práticas desleais de comércio.
A estratégia americana busca estrangular a economia brasileira em defesa de Bolsonaro, colocando o governo e as instituições políticas em situação de extrema vulnerabilidade. Por ter motivações essencialmente políticas, e não técnicas, há pouca margem para negociação e eventuais concessões por parte do governo Lula. As sanções contra Moraes, previamente sugeridas por Marco Rubio, representam um novo caminho perseguido pela Casa Branca para atingir seus objetivos políticos, ligados tanto aos interesses de empresas de tecnologia norte-americanas quanto aos desígnios ideológicos de uma extrema direita cada vez mais transnacional.
Casarões identifica uma intenção clara do governo americano de cercar ao máximo as possibilidades de negociação com o Brasil, impedindo que o governo brasileiro consiga se livrar das medidas punitivas. Segundo ele, existe uma “tempestade perfeita” de medidas tomadas por motivações ideológicas ou geopolíticas que tornam a margem de negociação do governo brasileiro muito pequena. Com o agravamento da situação do ex-presidente Bolsonaro, essa margem se reduz ainda mais.
O especialista observa que a narrativa de perseguição a Bolsonaro encontra eco na experiência de Trump, construindo a ideia de que o ex-presidente brasileiro é quase um espelho do americano no Brasil. Isso reforça uma ligação entre eles e pode fortalecer a percepção de que existe não apenas uma perseguição aos políticos conservadores, mas também uma espécie de conluio transnacional para persegui-los.
Ainda não está claro se as sanções contra Moraes e aliados substituirão as ameaças anteriores, que até agora ampliaram a popularidade do governo Lula e desgastaram o bolsonarismo, ou se serão complementares a elas. O que se configura é uma tentativa sem precedentes de interferência norte-americana no funcionamento da democracia brasileira.
Casarões avalia positivamente a mudança de postura do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que abandonou a cautela inicial em relação a Trump e passou a tratar os ataques americanos como ameaça à soberania nacional. Segundo o especialista, essa mudança de tom faz sentido no contexto atual e, se bem administrada, pode possibilitar um caminho para a reeleição ou para a eleição de um sucessor em 2026.
A perspectiva de efetivação das tarifas de 50% a partir do dia 1º de agosto aumenta consideravelmente, já que há muito pouco tempo hábil para que o governo brasileiro consiga negociar uma solução diante do cerco diplomático imposto pelos Estados Unidos.
As informações de Guilherme Casarões foi retirada em uma entrevista concedida a BBC Brasil.